26 de novembro de 2012

Crónicas de uma nova vida # 1

Não consigo neste momento falar pensar ou sentir para além disto e preciso de exprimir-me de alguma forma em algum recanto. Os meus filhos mais novos começam a sua vida numa UCIN (Unidade de Cuidados Intensivos Neonatais). Nos últimos tempos têm passado várias reportagens sobre a prematuridade nos noticiários mas efetivamente muito pouco ou nada se consegue mostrar do que é esta realidade. E a realidade é que é avassalador, avassalador, avassalador (é a palavra que ecoa no meu cérebro a cada instante). É avassalador em primeiro para o recém-nascido que não só passa do seu casulo aquático para um ambiente estranho antes de estar preparado como passa para um ambiente no qual não reconhece as vozes nem o toque  que lhe são familiares e onde tem de lidar com a dor física por força de entubações, agulhas, sondas, ventiladores etc. É avassalador para a família no geral e para a mãe em particular face à impotência que se sente perante a fragilidade de um filho.

Dia 1 - Os meus filhos nasceram com 2 minutos de intervalo, apenas lhes ouvi um choro tímido e me foram mostrados num relance na passagem entre as mãos do obstetra e a incubadora, do outro lado da porta. Deles só ouvi do doutor "são giros e são iguais". A anestesia acalmou a ansiedade. 

Dia 2 - Complicações pós-parto e não pude ver os meus filhos. Não sei o que me fez pior se lidar com a dor fisica se com a dor de sentir os meus filhos "ao abandono" num ambiente estranho. 

Dia 3 - Finalmente a primeira visita aos meus filhos e o embate com a realidade de uma UCIN. O abalroamento emocional não tarda. Os meus pequenos filhos estão rodeados de máquinas, com eletrodos, cateters, vendas, tudo ligado e montado nos seus corpos minúsculos, rodeados de pessoas que estão concentradas e preocupadas com a sua evolução/tratamento/bem-estar como tem de ser mas que não sabem lidar com a ansiedade da mãe e com a necessidade de entender o que se passa. 

Dia 4 - Um dos meus filhos tem uma agulha espetada do lado esquerdo do torax, "foi uma pequena bolha no pulmão, mas agora está estável", disseram mas já os ouvi muito longe tal foi a vertigem ao perceber o sofrimento do meu pequeno bébé a quem só queria agarrar e proteger. Levaram-me embora de volta para o quarto com a desculpa de que iam fazer um rx torácico e era melhor eu não estar presente. Mais uma vez a sensação devastadora de impotência. Chorei todo o dia, e toda a noite.

É-me muito dificil pôr por palavras os sentimentos dessa primeira semana: de cada vez que entrei nas portas decoradas com o Winnie the Pooh e o Mickey era tamanha a intimidação que não consegui fazer as perguntas que queria, tocar nos meus filhos como queria, falar-lhes e cantar-lhes como desejava. Intimidação face às máquinas e apitos e fios e registos e principalmente face àqueles profissionais que têm a vida dos meus filhos nas mãos e nos olhos.

Tive alta ao fim de uma semana de internamento e de 5 dias após o parto.
Sair da maternidade sem eles foi terrível, foi como se os abandonasse, chegar a casa sem eles foi outro choque incomensurável.
Nasceram fez hoje 10 dias, desde que tive alta vou de manhã bem cedo para a maternidade e fico até às 19h00 (apesar de todas estas novas rotinas, as rotinas do meu filho mais velho têm de ser respeitadas), já lhes toco e pego e falo e canto, mas também choro, sem eles verem .
Os meus filhos não nasceram no limite como muitos outros, hoje estão estáveis e estão a ganhar peso mas, e como me dizem daquelas portas para dentro, é um dia de cada vez.