Dom Casmurro, página 28
Não sei porque esperei por esta idade para ler o "Dom Casmurro" de Machado de Assis. Ele ali estava na estante, há anos, mas foi recentemente que começou a chamar-me, e eu a ler outras coisas e ele a chamar-me. De tão insistente, obrigou-me a largar pendente o que tinha em mãos e começá-lo de imediato. Parei logo na página 28 (só o facto de ser nesta página dava para outra conversa, mais simbólica do que objectiva) que termina com esta maravilha :" Os olhos continuaram a dizer coisas infinitas, as palavras de boca é que nem tentavam sair, tornavam ao coração caladas como vinham...".
Claro que os meus olhos se encheram de lágrimas, era previsível, ou não fosse eu altamente impressionável e permeável às emoções e sensações. Não foi só pela beleza literária ou pela comoção da cena mas também, e principalmente, porque a imagem que o meu cérebro resgatou não foi a visualização do Bentinho e da Capitu de 15 anos junto ao muro, mas sim a de um pátio barulhento e apinhado onde dois pares de olhos se encontraram a partir de pontas opostas e aí ficaram, no centro, parados e mudos, a dizer coisas infinitas, sem tempo nem espaço. Uma daquelas cenas de filme, arrumadinha, mas não apagada. E podia até ser uma memória falsa, mas não é, porque essas não assomam aos meus olhos desta forma.